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A COMIDA BAIANA NA OBRA DE JORGE AMADO

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No tabuleiro de Gabriela tem... Hábil na cozinha, a sensual personagem criada por Jorge Amado ajudou a exuberante culinária baiana a atravessar fronteiras.

Gabriela veio de longe, da terra seca, sem nenhuma gota d’água. Tinha cor de canela, carregava o cheiro de cravo, que levava sempre preso ao cabelo. Com seu jeito de menina e de mulher e talento para a cozinha, ela conquistou o seu patrão, o árabe Nacib, e metade de Ilhéus. No romance, Gabriela, Cravo e Canela, de Jorge Amado, que, neste ano, completaria 100 anos de vida, temperos e aromas se misturam, formando uma pintura para os olhos e o paladar. No tabuleiro da baiana Gabriela, tem acarajé, abará e tantos outros pratos da exuberante cozinha baiana.

A presença marcante da culinária brasileira nos romances de Jorge Amado teria uma função muito além do simples ato de comer. “Ele trabalha o alimento em todos os seus sentidos, não apenas o paladar, mas também o olfato, a visão, o tato”, conta Paloma Jorge Amado, filha do escritor e autora de A comida baiana de Jorge Amado (Editora Record). Todas as personagens femininas de Jorge Amado estão fortemente ligadas à culinária. Enquanto Gabriela e Dona Flor são cozinheiras profissionais, Teresa Batista aprende a cozinhar e o faz muito bem. “Mesmo Tieta, que não sabia cozinhar, é uma declarada apreciadora da boa mesa baiana”, completa Paloma.

Assim, a comida nunca aparece nas obras de Jorge Amado ao mero acaso. Elas podem potencializar a sensualidade de um personagem, como é com Gabriela; ou como meio de independência, como Dona Flor, que sustentava a casa com as delícias que cozinhava.

A influência da cozinha também vem da religiosidade. Jorge Amado era ogã, um membro importante do candomblé, religião de matriz africana com forte presença da comida. “É por isso que o escritor rompe a noção da inferioridade da cozinha e da cozinheira. Na religião, alimento é símbolo de força, cada orixá tem o seu alimento símbolo. Se dá e se tira a vida pelo alimento”, conta Gildeci de Oliveira Leite, professor da Universidade Estadual da Bahia e especialista em Jorge Amado. Dessa forma, cozinhar estava entre as mais nobres funções dos personagens criados. “Gabriela salva o bar de Nacib com seus quitutes e Dona Flor sustenta dois maridos com suas merendas”, diz o pesquisador.

Apesar de profundo apreciador da gastronomia, Jorge Amado não tinha familiaridade com temperos e caçarolas, conta a filha. Na hora de descrever os preparos realizados por Gabriela – que ganha sua segunda versão para a tevê, interpretada pela atriz Juliana Paes –, por Dona Flor,por Tereza Batista e por outras tantas cozinheiras eternizadas, o escritor recorria a lembranças dos quitutes primorosos que havia experimentado. “Ele tinha uma memória paladar apuradíssima. Quando estava escrevendo, lembrava de um prato preparado por alguma cozinheira amiga e ia atrás dela para descobrir os detalhes da preparação.”

Texto de Max Milliano Melo publicado na coluna "Gastronomia" do "Jornal de Commercio', Rio de Janeiro, 29 de junho e final de semana 29 e 30 de junho de 2012. Digitalizado, adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.


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