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O HOMEM, O ÁLCOOL E A RESSACA

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Na pré-história, no período neolítico (por volta de 7000 a.C.), o homem mascou grãos, cuspiu numa jarra, deixou fermentar e descobriu o álcool. Na manhã seguinte, acordou e descobriu a ressaca. Foram necessários alguns milhares de anos (e muita dor de cabeça) até que um médico assírio criasse uma poção para o desconforto que sentia depois da bebedeira, em 900 a.C. Não funcionou, claro. E desde então a humanidade entrou numa busca obsessiva pela cura daquela dor de cabeça insuportável. Uma busca que ainda não terminou.

O homem foi à Lua e inventou a nanotecnologia, mas não conseguiu se livrar da ressaca. Algumas coisas a amenizam, como isotônicos e vitaminas, mas a moderação ainda é o único remédio eficaz. Às favas com a moderação, você diz? Então descubra 0 que acontece com seu corpo e aprenda o que real mente funciona contra a maldita sensação de que o mundo deveria acabar numa explosão atômica.

O DIA SEGUINTE

Não é o álcool que causa o sofrimento, mas os processos bioquímicos que ele deflaga.

ACETALDEÍDO
Substância tóxica resultante da metabolização do álcool pela enzima álcool desidrogenase (ADH). Inflama células de tecidos por todo o corpo até ser neutralizado, causando o grosso da ressaca.

FALTA DE HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO
A vasopressina faz o rim reabsorver água. O álcool inibe sua produção e faz com que a água vá direto para a bexiga, causando desidratação à medida que você bebe.

REDUÇÃO DE GLICOGÊNIO
 Glicogênio (moléculas de glicose) é a reserva de energia do seu corpo.O álcool inibe sua reposição, derrubando os níveis de açúcar e deixando você mole e com o raciocínio travado.

GLUTAMINA
O álcool deprime a ação dos neurônios, o que reduz a produção desse neurotransmissor. Quando você dorme, o corpo volta a produzir glutamina desreguladamente, perturbando o sono.

ONDE DÓI

Um mapa daqueles sintomas que você conhece tão bem.

0NDE:CEREBR0
0 QUE: DOR DE CABEÇA
O álcool tem ação depressiva nos neurônios. Os nervos das paredes arteriais ficam inflamados e dilatados. O sangue é bombeado e tensiona esses nervos, causando dor de cabeça latejante.

ONDE: MUSCULOS
 0 QUE: FRAQUEZA
Junto com toda aquela urina se foram grandes quantidades de potássio e magnésio, eletrólitos fundamentais para a contração muscular. Com esses níveis baixos, os músculos ficam “preguiçosos".

ONDE: INTESTINO
0 QUE: COMPORTAMENTO ANTISSOCIAL
A intoxicação das células intestinais pelo etanol e pelo acetaldeído leva a cólica se faz o trânsito intestinal acelerar vertiginosamente. Sim, você já sabe no que isso dá.

ONDE:OLHOS E OUVIDOS
0 QUE: SENSIBILIDADE À LUZ E AO SOM
Estímulos sensoriais causam tensão nos neurônios danificados.Eles doem ainda mais quando o sol - aquele desgraçado entra pela sua janela.

ONDE: ESTÔMAGO
0 QUE: NÁUSEA, GASTRITE E FALTA DE APETITE
O álcool inflama a membrana estomacal. Isso causa aquela dor inconfundível no dia seguinte e pode levar seu corpo a se considerar envenenado. Ou seja, você pode vomitar e perder o apetite.

AMANHÃ DE MANHÃ, NADA DE CAFÉ...

Para se recuperar, seu corpo precisa de certas substâncias. Veja o que funciona de fato o que é lenda.

FUNCIONAM:

ABACATE
A parceira inseparável da cisteína é a glutationa. Sem ela, o acetaldeído não é metabolizado. O abacate é uma fonte dessa substância.

ASPIRINA
Reduz dores de cabeça e corporais. Pode agredir o estômago, mas é melhor que o parace tamol tóxico para o fígado - que já está ferrado.

ISOTÔNICOS
Eles hidratam, repõem sais importantes para seu corpo (magnésio, potássio, sódio) e são absorvidos rapidamente, sem pesar no estômago.

OVOS
O ovo é rica fonte de cisteína, um dos neutralizadores do acetaldeído que está envenenando o seu corpo. Aumentar a cisteína acelera a purificação.

TOMATE
Tomates contêm potássio, em falta no seu corpo, frutose, que ajuda a combater a hipoglicemia, e carboidratos, que estimulam a liberação de insulina.

NÃO FUNCIONAM

BLOODY MARY
O drinque que Frank Sinatra bebia no dia seguinte alivia porque embriaga de novo e mascara os efeitos da ressaca, mas envenena ainda mais. O suco de tomate até ajuda, mas ajudaria mais sem o álcool.

CAFÉ
Cuidado: a cafeína parece uma aliada, mas sobrecarrega o fígado e ataca o estômago.

PÍLULAS ANTI-RESSACA
Chaser, RU-21 e Rebound não entregam o que prometem: o carvão ativo, base dessas pílulas, só reduz níveis de álcool no corpo se ingerido em doses muito altas, que as pílulas não têm.

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ASSIM CAMBALEIA A HUMANIDADE

Do surgimento do álcool ao Gatorade, a evolução da ressaca.

7000 a.C
0 desenvolvimento da agricultura leva à produção de bebidas alcoólicas. Na manhã seguinte, o homem neolítico conhece a ressaca.

911 a.C
Os assírios tinham duas poções para quem exagerava: bicos de aves moídos com óleo de mirra ou uma mistura de ervas, mirra e vinho.

500 a.C
Surgem três receitas greco- romanas: repolho, canários fritos e amêndoas amargas com enguias cruas.

1113
Os ancestrais dos russos usavam as banyas (saunas) para “suar” a ressaca. No fim das contas, esse método só piora a desidratação.

1897
0 alemão Felix Hoffman inventa a aspirina. Pouco depois, seu efeito analgésico passa a ser usado contra a ressaca na Alemanha.

1930
Surge o prairie oyster, uma gema de ovo, vodca, vinagre, tabasco, molho inglês, ketchup, pimenta e sal. Sirva num copo e vire.

1965
Cientistas da Universidade da Flórida criaram o Gatorade para os Gators, seu time de futebol americano. Ele propicia a reposição de água e sais.

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ANTES, DURANTE E DEPOIS

Se for beber, não bobeiee sofra menos no dia seguinte.

ANTES
Coma: Carboidratos (pão) diminuem a absorção de álcool no estômago, e gorduras (azeite) desaceleram a descarga estomacal.

DURANTE
Beba água: Faça esse esforço e tome copos de água entre as doses. Você está reduzindo e  desacelerando a desidratação.

DEPOIS
Tomate e aspirina: Tomate com sal garante três coisas que ficam em falta no dia seguinte: potássio, magnésio e sódio.

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ÁS VEZES, MENOS É MAIS

Não só o tipo, mas a qualidade da bebida também pode ser determinante.

MENOS RESSACA

1. Uma garrafa (720 ml) de saquê do tipo Junmai Daiguinjo.

2. Cinco doses de vodca russa legítima (250 ml) com gelo.

3. Meia garrafa (375 ml) de vinho tinto francês com níveis reduzidos de sulfito e tanino.

MAIS RESSACA

1. Três doses (120 ml) de gim de baixa qualidade (suspeite de qualquer coisa feita fora de Londres)

2. Tres doses (150ml)de caipirinha feita com vodca de procedência duvidosa.

3. Cinco doses (250ml) do ‘scotch” que o seu cunhado comprou baratinho de um amigo do trabalho.

É PRECISO SABER BEBER

A sua ressaca está diretamente ligada ao que você bebeu

VINHOTINTO
Um pesadelo. Açúcares, carboidratos, resíduos de madeira, ácidos graxos e proteínas dão o sabor à bebida, mas precisam ser processados pelo fígado - que já está ocupado com o álcool.

CONHAQUE/BRANDY
Com algo entre 36% e 40% de teor alcoólico, é absorvido mais lentamente que o vinho. Ainda assim, as impurezas da uva e o sulfito estão presentes, o que deixa o brandy bem à frente de outras bebida;

UÍSQUE
0 nível de impurezas é alto porque o envelhecimento em carvalho agrega resíduos do casco e forma moléculas complexas. Single malts são melhores porque não há mistura de impurezas.

CERVEJA
As piores são as não-filtradas, como boa parte das de trigo, e as feitas com cereais não-maltados, pois cada ingrediente adicionado à fermentação libera um tipo de impureza.

CACHAÇA
Cachaças neutras, rigorosamente destiladas e filtradas dão menos ressaca do que as coradinhas. Boas cachaças, destiladas e filtradas várias vezes, têm menos impurezas.

GIM
A variedade de ervas, flores, frutas e grãos usados para aromatizá-lo espalham diferentes tipos de impurezas ainda que em baixa concentração.

VODCA
Quanto mais destilada e filtrada, mais pura a vodca e mais neutro seu sabor. Ainda assim, a variedade de grãos e legumes (batatas e beterrabas, principalmente) inclui subprodutos no líquido final.

SAQUÊ PREMIUM
O arroz usado na fermentação é polido a pelo menos 50%, mantendo apenas o amido do grão,que vira álcool no processo. Por fim, é diluído em água, que chega a compor 80% do saquê.

Texto de Bruno Lazaretti publicado em "Playboy", Brasil, junho de 2009, ano 34, n. 409, excertos pp.115-118. Digitalizado, adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.


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